ESPIRITUALIDADE E AMBIENTE DE TRABALHO
Qual relação há entre ambos
EBERVAL CALAZANS SANTOS
Estudante do Curso de
Administração de Empresas
Unidade de Ensino Superior
de Feira de Santana – 6º Semestre
ebercalazans@yahoo.com.br
FEIRA DE SANTANA - BA
2013
Trabalho de pesquisa
científica sob a orientação do professor Gilsimar, como requisito para a
publicação acadêmica do curso Bacharelado em Administração do 7º semestre da
Unidade de Ensino Superior de Feira de Santana - UNEF/FAN.
“Descobrimos nossa espiritualidade quando
despertamos para a finitude da vida.
Por isso velórios nos fazem tombar no silêncio.”
AUGUSTO CURY
Existe a diferença entre religião, religiosidade e
espiritualidade. Atualmente as empresas estão inserindo em sua cultura
organizacional a prática da religiosidade para que os funcionários possam
adquirir um comportamento voltado à coletividade, à motivação em nome da honra
espiritual, ao relacionamento interpessoal, ao comportamento social, para que,
assim, os resultados possam se elevar cada vez mais, além da fidelização dos
funcionários com sua respectiva empresa. E quando se trata de religião,
pergunta-se: são as Igrejas que estão entrando no mundo administrativo ou a
Administração que está entrando nas Igrejas? Na verdade as duas coisas estão
acontecendo, e por esse motivo há uma urgência das pessoas conectarem a
religião ao trabalho para garantir sua paz interior e uma aceitação social,
como também há uma necessidade de inserir o trabalho administrativo nas Igrejas
para que a organização possa fluir da mesma forma que fluem as empresas
convencionais.
PALAVRAS-CHAVES:
Religiosidade.
Espiritualidade. Ambiente de Trabalho.
ABSTRACT
There is a difference among religion,
religiosity and spirituality. Currently companies are putting into your
organizational culture the religious practice so that employees can purchase
behavior backed to the collectivity, to the motivation in the name of spiritual
honor, interpersonal relationships, social behavior, this way the results may
be raise increasingly beyond the loyalty of employees to their respective
company. And when it comes to religion, the question become: are the Churches
that are entering the administrative world or management that is coming in the
Churches? In fact both things are happening, and for this reason there is an
urgent need of people connecting religion at work to ensure their internal
peace and social acceptance, as there is a need to enter the administrative
work on the churches so that the organization can move forward in the same way
that conventional companies can.
KEYWORDS: Religiosity. Spirituality. Desktop.
INTRODUÇÃO
O objetivo desta pesquisa é examinar as relações entre
espiritualidade e ambiente de trabalho, fazer reflexões sobre a existência
espacial para envolver religiosidade no mundo dos negócios, analisar a
espiritualidade reaparecida atualmente no âmbito social e tentar entender como
isso é associada ou adaptada à cultura da modernidade e ao avanço da
pós-modernidade.
A discussão sobre espiritualidade no trabalho foi criada
através de pesquisas que abordam a busca do prazer, eliminação do sofrimento ou
realização das potencialidades do ser humano nas organizações. Desta,
pesquisou-se a fundo o significado, o propósito, o crescimento pessoal e o
sentido da vida, e foram encontradas pré-conceitos e visões de mundos
marginalizados quando considerados como a principal meta do ambiente de
trabalho.
Pesquisadores pressupõem que a religiosidade está cada
vez mais distante dos limites das religiões institucionais, pois ela tem se
manifestado em espaços diversos e distintos dos das igrejas, dos santuários e
locais cultos. A religião não tem mais controle sobre a religiosidade e esta
tem sua liberdade e autonomia em vários âmbitos sociais.
Há também, em decorrência dessa autonomia, brechas para
questões polêmicas e preocupantes, em que a maximização dos resultados
financeiros foi valorizada decorrente das maneiras empresariais de recrutar
dentro do âmbito religioso, através da ação dos pastores, bispos e mentores
espirituais. Disto surge o modelo religioso-empresarial em empreendimentos
neopentecostais que incluem, entre outras, a Igreja Universal do Reino de Deus
e a Igreja Apostólica Renascer em Cristo, que são exemplos de “organizações de
simbolismo intensivo” (Wood Jr., 2001). Essas igrejas investem em espetáculos
teatrais e cinematográficos em uma sociedade que valoriza imagens e símbolos.
RELIGIÃO,
RELIGIOSIDADE E ESPIRITUALIDADE
Na primeira metade do século XX, onde reinava a
modernidade capitalista, a sociedade foi influenciada pela idéia de que a
religião atrapalhava seus negócios e seu cotidiano somente em processo de
produção, e por isso ela era separada desse meio e de preferência jamais
manifestada. Já na segunda metade do século XX, reverteu-se a situação e a
religião voltou a freqüentar as unidades de produção.
Existem diferenças entre “religião”, “religiosidade” e “espiritualidade”:
Religião
- O
termo “religião” faz referencia a doutrinas, a códigos de conduta, a loca e
tempo de cultos, a liturgias, a rituais praticados e regulados por
especialistas treinados para servir as instituições e organizações que
administram a prática religiosa.
Religiosidade
- É
a qualidade de ser religioso e ter uma religião. É sua conduta íntima a base de
regras religiosas. É ser consistente em seus aspectos de acordo com a religião
adotada, independente de se a freqüenta ou não.
Espiritualidade
- É
algo mais livre das amarras institucionais e organizacionais que o termo
“religião” adota. É seguir uma filosofia religiosa sem se apegar aos detalhes. Podem-se
seguir diversas e filosofias de distintas religiões, o que implica maior
tolerância e sincretismo, possibilitando uma busca nas várias fontes espirituais
daquelas forças consideradas transcendentais aos indivíduos.
A busca pela espiritualidade na sociedade atual dá ao
indivíduo um leque de opções para ser confeccionado do jeito que quiser na
preparação de uma aquarela religiosa.
A espiritualidade contêm uma
natureza moral e emocional, em que se investiga a existência no Universo. A
religião implica num suposto sistema organizado de rituais e cerimônias (Bierly
et al., 2000).
Espiritualidade nesta pesquisa não é unívoco de religião.
Cada vez mais a palavra espiritualidade está afastada de conotações religiosas
e cada vez mais perto de conotações sobre o bem-estar individual e social
(Harrington et al., 2001; Overell, 2002; Duchon e Plowman, 2005).
O
PAPEL DA RELIGIOSIDADE NO TRABALHO
“Ao tratar
da questão religiosa, o professor Leonardo Boff sugere que as igrejas devem
renunciar a pretensão de ser a única portadora da verdade e, por isso,
sentir-se superior e fora da sociedade. Reconhece que elas têm direito a expor
sua opinião, mas sem qualquer imposição às pessoas. Aponta que a grande maioria
das instituições religiosas se autofinalizam porque se preocupam
prioritariamente em conservar seu lugar social e poder”. (Arrais, 2011, p.01)
Se analisarmos de ponto de vista científico, a Igreja não
deve escolher um mundo para o qual quer que seja, e sim, aceitar esse mundo
como se apresenta atualmente, e se preparar para aceitar um futuro mundo com
outras expectativas de horizontes, cada vez mais laico e pluralista. A Igreja
deve acompanhar a sociedade e não se jogar à frente dela ou tampouco segui-la
(cuja tendência pode acabar sendo essa, caso ocorra um único deslize em sua
eterna hegemonia). Ela deve rejeitar o anseio de ser a única mensageira da
verdade e, por isso, sentir-se superior e fora da sociedade (Leonardo Boff,
2011). Tal como outra organização, a Igreja tem o direito de expor sua opinião,
mas não cabe a ela impô-la aos seus seguidores.
Ao fazermos essa conexão da espiritualidade com o
trabalho, somos provocados a pensar sobre o espaço da produção e dos negócios
como um ambiente recompensável e que pode oferecer aos trabalhadores um prazer
além do que os seus ganhos materiais lhe proporcionam. A narrativa do livro de
Gênesis, na Bíblia Sagrada, deixa claro que o trabalho é a forma como o ser
humano coopera com Deus para colocar ordem ao caos, sendo essa maneira como
participa da força criativa divina. O mundo do trabalho cotidiano oferece ao
trabalhador as fronteiras que orientam o seu comportamento. É por isso que o
desemprego gera uma preocupação que vai além do financeiro, cuja sensação possa
estar encubada em algumas pessoas, ou seja, sem estarem conscienciosas disso.
Logo, a tendência é um crescente número de pessoas que procuram movimentos e
formas de religiosidades para avançar o processo de ascensão social ou evitar o
descenso. Para isso, existem muitos métodos de treinamento, receitas práticas
de como aumentar o bem-estar dos colaboradores de uma organização, baseados
nesta ou naquela espiritualidade.
A implantação da espiritualidade no ambiente de trabalho
ocorre na década de 80, em uma reação à ganância corporativa. A indústria
norte-americana de publicações nomeou os últimos dez anos como “a década da
alma”, e que podemos chamar de movimento da espiritualidade no mundo
corporativo, que começou a ser notado no Brasil no final da década de 90. Em
sua edição de janeiro de 1999, a revista Você S.A. descreve o fato da
espiritualidade chegar às empresas, como segue:
“Algumas
companhias brasileiras já estão pedindo ajuda aos céus – literalmente. Empresas
como Mercedes-Bens, Maganizines Luiza, Computer Associates e Superbom abriram
espaço para a ‘espiritualidade’ dentro de seus escritórios. O que seria isso?
Basicamente, é abrir espaço, no ambiente profissional, para a vivência
religiosa, na suposição de que os cuidados com a alma ajudem na solução de
conflitos no dia-a-dia do trabalho. A espiritualidade no local de trabalho já é
uma forte tendência nos Estados Unidos. No ano passado, o The New York Times
informou que as barreiras entre trabalho e religião estão caindo por terra. O
jornal falou de uma crescente aceitação dos comportamentos abertamente
religiosos nas empresas e citou alguns exemplos: na Boeing há pessoas estudando
o Alcorão, na Microsoft os funcionários têm aulas de Torá, na Intel grupos de
estudos islâmicos se reúnem regularmente” (Letícia Colombini, 1999, p.02).
Laura Nash e Sotty Mclennan (2003,
p.24) apresentam seis realidades que influenciam a chegada da espiritualidade
no mundo do trabalho:
1) A
geração pós-guerra, nascida entre 1946 e 1964, que acredita que o trabalho deve
resultar em algo mais do que o salário ao final do mês;
2) A
economia global, que exige a integração entre múltiplas formas de culturas e
tradições religiosas;
3) Crescente
estresse relacionado ao trabalho, sendo a espiritualidade uma fonte de
alternativas às propostas do iluminismo científico;
4) Novos
conceitos científicos, como, por exemplo, a teoria do caos, a física quântica,
e a genética;
5) Paradigmas
pós-modernos, que promovem a integração entre ciência e religião como fonte de
verdades e salienta que inteligências múltiplas são essenciais para a
convivência com a incerteza e a necessidade de adaptação;
6) O
surgimento dos gurus de negócios, que propõem uma nova mentalidade corporativa.
Na empresa em que eu trabalhava no
Rio de Janeiro, a primeira coisa que diretor fazia ao chegar era passar por
todos os setores meditando, incluindo a sala de reunião vazia e até os
banheiros. Das três empresas que ele possuía a que eu fazia parte era a única
que ele repetia esse ritual todos os dias e tinha mais afeição. Nas outras duas,
ele colou atrás dos computadores e sobre a boneca da porta talismãs com
simbologias orientais e prismas para atrair bons fluídos e sobrepujar o mau-olhado.
Sendo força de fé ou coincidência, das três empresas que ele possui, essa em
que eu fazia parte foi a única que sobreviveu.
Esse relato acima é um exemplo de
como empresários e executivos brasileiros vêm incorporando a religião e, de
forma mais abrangente, a espiritualidade ao mundo do trabalho. De fato não é
regra para o mundo corporativo, mas são cada vez mais comuns.
“Um dos sintomas mais claros do aumento da busca por
espiritualidade nas empresas é o mercado de palestras. Desde o começo dos anos
90, vem crescendo a oferta de especialistas nesse nicho. Estão aí incluídas
desde as mensagens de inspiração abertamente religiosa, como os ensinamentos de
Cristo aplicados à gestão, até o sucesso alcançado por gurus que pregam os
hábitos das pessoas bem-sucedidas, a meditação como forma de combater o
estresse etc. ‘De uns cinco anos para cá é que eu entendi que existe um mercado
ávido por palestras de espiritualidade’, afirma o rabino carioca Nilton Bonder.
Desde que escreveu A Cabala do Dinheiro, em 1991, ele tem sido chamado para
falar para públicos corporativos. Sem fazer nenhum esforço específico para
atingir o mundo das empresas, Bonder tem visto a procura por suas palestras
aumentar. Ele costuma fazer 15 por ano, em média. No ano passado, teve de
começar a recusar convites” (Cohen, 2002[1]).
Para Laura Nash
(2003, p.28), há três instâncias de espiritualidade nas empresas:
1) Nível espacial –
os ritos, o proselitismo. Para Laura, “levar esse aspecto da religião para o
mundo corporativo é ir um pouco longe demais”;
2) Religião catalítica – a
ética, as práticas de meditação, a oração. É o aprendizado das atitudes
religiosas, dos objetos da espiritualidade, que podem levar à transformação
positiva.
3) Nível da fundação –
tentativa de compreender a visão de mundo e a sabedoria de religiões milenares.
Segundo David Cohen, essa nova onda
de espiritualidade estaria provocando o abandono das formas de gestão dos
negócios fundamentados tão somente na racionalidade, nos números e na
lucratividade. Para o autor da matéria, estava subentendida uma denúncia dos
aspectos de que seria necessário deixar insurgir uma nova espiritualidade no
trabalho. Isso porque os modelos tradicionais de gestão não mais demonstravam
quaisquer preocupações com o lado psíquico, emocional ou espiritual das
pessoas, e nisso estava embutida a “dimensão desumana” de nosso sistema econômico.
“Aparentemente, religião e espiritualidade
aparentam estar distante da administração. De fato, a administração esforça-se
por parecer científica, como tal, espera-se que tome como base os princípios da
razão” (Bertero, 2007, p. 01).
É de
se assumir que a gestão e espiritualidade não estão diretamente associados,
mesmo nos dias de hoje, porém encontramos práticas de gestão influenciadas pelo
pensamento religioso.
No Brasil, essa nova fase de inquietação com a
espiritualidade no mundo dos negócios encontrou uma realidade cultural
diferente do que encontramos no cenário marcado pelo processo de desapego
religioso na transição do século. Os brasileiros sempre valorizaram a
subjetividade, as relações pessoais, as emoções e a religiosidade herdada dos
povos indígenas e africanos (Leonildo Campos, 2008).
No mundo de gestão no Norte da América, onde a
modernidade na organização do trabalho lidera há muito tempo, ressurgiram nos
anos 90 as preocupações quanto ao desafio de se conciliar valores e trabalho,
espiritualidade, fé e trabalho, ou seja, religiosidade e negócios. Associado ao
estilo burocrático, a idéia foi implantar a supervalorização do lado racional,
calculável, utilitarista da vida no ambiente de trabalho, em detrimento do
dinamismo do estilo carismático. Porém o advento dessa ordem burocrática
violentou tais características.
O propósito da espiritualidade no ambiente de trabalho é
a busca de estados mais elevados de consciência e o alinhamento das ações das
pessoas, das equipes e das organizações com suas metas.
O indivíduo trabalhador não quer ser visto como uma
engrenagem, cujo combustível é somente o salário.
“Ele
precisa de algum aditivo para estar motivado para agir, sendo que sua motivação
e reações são diretamente proporcionais ao sentimento de ser tratado como ser
humano” (Rasera, 2010[2]).
Portanto,
ter a espiritualidade inserida nas empresas não é nada fora do comum, e sim, já
fazem parte dos novos modelos que remontam há milênios.
“A
espiritualidade no trabalho é um movimento amplo e crescente de busca de
estados mais elevados de consciência, que estimulem as pessoas, equipes e as
organizações a identificar e praticar ações visando tornar a empresa uma cidadã
consciente em sua comunidade, região e planeta. A espiritualidade no trabalho
tem implicações diretas na relação da empresa com os clientes, visão de
resultados, liderança, gerenciamento de pessoa, ecologia, educação,
desenvolvimento e bem-estar físico, emocional e espiritual. Com isto se
encorajam ações de transformação pessoal em seus relacionamentos e em seu
ambiente”. (Gustavo Boog, 2006, p.01)
A visão mecanicista tradicional separa a nossa vida
cotidiana da espiritual, sendo que trabalhamos de segunda a sábado e no domingo
vamos à missa, reunião ou culto de orações, segundo a crença de cada um. A
visão de espiritualidade une estes mundos, transformando o ambiente de trabalho
num lugar privilegiado onde podemos praticar nossas crenças, despertando o
sentimento de fraternidade que se manifesta sob o nome de “espírito de equipe”.
No entanto, esta relação está atrelada à clareza que o indivíduo tem sobre a
sua missão dentro da empresa e do mundo. Trata-se da compreensão de que seu
trabalho, independente da função ou cargo que exerça, tem um significado, um
propósito, e que tem impacto direto na vida de outras pessoas.
A expressão “espiritualidade no mundo do trabalho” é
associada e confundida com “religião no mundo do trabalho”. A espiritualidade
segue uma filosofia religiosa, absorvida mais com a transcendência, pelo fascínio
pela infinita sabedoria, pela aceitação de que tudo pode ser, de as energias
podem ser catalisadas entre si e que Deus é pai de todas as religiões; é uma
visão muito particular de cada um que está manifestada através do respeito às
diferenças. A religião tem mais a ver com padrão de comportamento e visão.
“A
afirmação de que, no mundo do trabalho, a espiritualidade está a serviço da
religião implica a dimensão proselitista da vivência espiritual. Entende-se por
proselitismo a “atividade ou esforço de fazer prosélitos”, sendo prosélito
aquela “pessoa que foi atraída e que se converteu a uma religião, uma seita,
uma doutrina”, conforme Houaiss” (René Kivitz, 2007[3])
Bene Catanante constata que
“pessoas
com grau de espiritualidade bem desenvolvido costumam ter clareza de sua
missão, dos benefícios que agregam com o próprio trabalho, da diferença que
fazem no mundo pessoal, profissional e na comunidade em que vivem” (Catanante,
2000, p.63).
Segundo Mario Sergio Cortella (2009), esta consciência
obtida pelas pessoas espiritualizadas relaciona-se com a visão holística que
não terminam em si mesmas, e sim, vão além delas, como parte de algo maior e
coletivo.“A espiritualidade é a resposta a um desejo forte de a vida ter
sentido, de ela não se esgotar nem naquele momento, nem naquele trabalho”
(Cortella, 2009, p.13). Esta caça ao desígnio no ambiente de trabalho que o
indivíduo realiza o permite que enxergue no resultado de tudo que ele faz,
transformando a sensação de martírio em prazer divino. Desta forma é que todos
nós conseguimos nos encontrar naquilo que fazemos e atingir o fluxo do
trabalho, pois do contrário, nos alienamos, enxergamos nosso trabalho como
punição, ficamos insatisfeitos, vivemos sob constante estresse e abrimos espaço
para a tristeza aumentar ainda mais o vazio dentro de nós.
A
RELIGIOSIDADE E SUA INFLUÊNCIA DIRETA
Há de se convir que tudo que acreditamos automaticamente
aplicamos no nosso cotidiano. O nosso corpo se expressa inconscientemente. O
que devemos atentar é se nossa pré-disposição no âmbito social está voltada
para uma seita ou para a egrégora espiritual. Cada um tem o
poder de escolher os fatos, mas não tem o poder de escolher as conseqüências, e
por isso o ambiente de trabalho é território delicado para assumir
comportamentos no qual não sabemos como será a recepção e compreensão dos
colegas.
De um lado, há no âmbito social a seita, proveniente de “seguir”, conceituando-se complexamente com a
ação de designar, em princípio, qualquer doutrina, ideologia, sistema
filosófico ou político que discorde da doutrina ou sistema dominante social,
provocando ruptura nos conceitos existentes. É importante saber que a seita não
está ligada única e diretamente à grupos religiosos, e sim, também pode de ser
ligada a grupos políticos, estudantis, filosóficos, poetas, entre outros. Por
outro lado, há também a egrégora, proveniente
de “velar” e “viajar”, sendo que ela se denomina a entidade criada a partir do
coletivo pertencente a uma assembléia, ou seja, é um campo de energia criado no
Plano Astral a partir da energia emitida por um grupo de pessoas através dos
seus padrões mentais e emocionais, gerando somatório de “energias físicas e
mentais” de duas ou mais pessoas, quando se reúnem com qualquer finalidade.
A
Igreja de Jesus Cristo Dos Santos Dos Últimos Dias
Também conhecida como “A Igreja dos Mórmons”, é um
exemplo de religião que influencia aos jovens buscarem trabalho cedo, com a
finalidade de valorizar o trabalho e saber se comportar diante da sociedade tão
exigente. Os SUD’s (Santos dos Últimos Dias, como realmente são chamados)
adultos induzem os adolescentes a procurarem empregos ou formas de juntar
dinheiro antes de completar 18 anos, para que por eles mesmo possam investir
financeiramente na própria jornada missionária no prazo de 02 anos assim que atingir
a maior idade e após servir o exército, caso sejam convocados.
Vendo a dificuldade que é encontrar um emprego descente,
a Igreja dos Mórmons fundou um banco de empregos mais voltados aos membros da
própria egrégora para que ainda jovem possam estar aprendendo a desenvolver
postura profissional, aprender a fazer planejamentos financeiros, a valorizar o
pagamento do dízimo e investir nos estudos. O incentivo é levado tão à sério
que a Igreja faz campanhas, treinamentos, indicações e até alguns líderes se
responsabilizam diretamente pelo comportamento deles em ambientes de trabalho.
Houve um período em Feira de Santana, cidade situada a
98km próximo de Salvador (capital baiana), que algumas instituições, como a
Finivest por exemplo, estavam
contratando somente os SUD’s para fazer parte da corporação, pelo exemplo de
fidelidade e compromisso. Isso enriqueceu o marketing
que a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos dias fazia na cidade.
A
Igreja Adventista do Sétimo Dia
Há uma citação na Bíblia que diz:
“Lembra-te
do dia de sábado, para o santificar. Seis dias trabalharás e farás toda a tua
obra. Mas o sétimo dia é o sábado do Senhor, teu Deus; não farás nenhum
trabalho, nem tu, nem o teu filho, nem a tua filha, nem o teu servo, nem a tua
serva, nem o teu animal, nem o forasteiro das tuas portas para dentro; porque,
em seis dias, fez o Senhor os céus e a terra, o mar e tudo que neles há, e, ao
sétimo dia, descansou; por isso, o Senhor abençoou o dia de Sábado e o
santificou” (Êxodo 20:8-11).
Com base nessa citação, os Adventistas trabalham até o
pôr-do-sol de sexta-feira, podendo retornar a partir do amanhecer do domingo.
Essa convicção religiosa levou a muitas organizações a dispersarem
profissionais adventistas por causa das faltas no sábado, o que poderia causar
problemas para alguns colegas de trabalho que estariam cumprindo sua jornada
neste dia. Essa situação causou polêmicas na década de 80 e até hoje ainda
existem empresas que perguntam ao candidato na hora da entrevista se esse segue
alguma religião que o convença a não trabalhar aos sábados.
A sociedade atualmente está mais disposta a aceitar essa
crença, baseada na Lei, em expressão sobre a liberdade religiosa, que está
consignada no título referente aos Direitos e Garantias Fundamentais que “é inviolável a liberdade de consciência e de
crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida,
na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias” (art.
5º, VI, da CR/88).
Através destes direitos publicados em Lei, os adventistas
conseguiram ganhar causas em situações mais delicadas, como os profissionais de
enfermagem, que podem discutir escalas e se negarem de prestar serviços aos
sábados. Porém cabe a consciência de cada um dentro deste âmbito profissional,
que é lidar com a saúde das pessoas, distinguir o que realmente lhe traz uma
justificativa exclusivamente profissional ou, além disso, a justificativa
espiritual, compreendendo uma profissão voltada a ajudar pessoas.
De acordo com Washington Gonçalves, que já é técnico em
enfermagem e está cursando o módulo de 2 do curso de radiologia, a posição da
Igreja é clara e não há como “ir contra a vontade de Deus”. No entanto, não ele
não se recusa a trabalhar aos sábados. Segundo ele, esse dia pode ser usado
para fazer o bem, como diz Jesus, na Bíblia:
“Qual
dentre vós será o homem que, tendo uma só ovelha, se no sábado ele cair numa
cova, não há de lançar mão dela, tirá-la? Ora, quanto mais vale um homem do que
uma ovelha! Portanto, é lícito fazer o bem aos sábados” (Mateus 12:11-12).
Washington entende que sua profissão vai mais além que o
profissional, e diz: “eu não posso deixar de atender os meus pacientes. Ninguém
escolhe quando vai ficar doente”.
“O reconhecimento
da liberdade religiosa pela Constituição denota haver o sistema jurídico tomado
a religiosidade como um bem em si mesmo, como um valor a ser preservado e fomentado.
Afinal, as normas fundamentais apontam para valores tidos como capitais para a
coletividade, que devem não somente ser conservados e protegidos, como também
ser promovidos e estimulados.
A Constituição
protege a liberdade de religião para facilitar que as pessoas possam viver a
sua fé. Daí a Constituição chegar a prever a assistência religiosa para os que
estejam submetidos a internação coletiva (art. 5º, VII).
O reconhecimento da
liberdade religiosa decerto que contribui para prevenir tensões sociais, na
medida em que, por ela, o pluralismo se instala e se neutralizam rancores e
desavenças decorrentes do veto oficial a crenças quaisquer. O reconhecimento da
liberdade religiosa também tem por si o argumento de que tantas vezes a
formação moral contribui para moldar o bom cidadão. Essas razões, contudo, não
são suficientes em si para explicar a razão de ser da liberdade de crença. A
Constituição assegura a liberdade dos crentes, porque toma a religião como um
bem valioso por si mesmo, e quer resguardar os que buscam a Deus de obstáculos
para que pratiquem os seus deveres religiosos”.
(São Paulo: Ed. Saraiva, 2008, p.419-420)
Salão
do Reino das Testemunhas de Jeová
A Igreja Salão do Reino das Testemunhas de Jeová foi
fundada no fim do século XIX por Charles Taze Russel, em 1874, sob influência
das doutrinas adventistas, formado por seu próprio grupo de estudos bíblicos na
Pensilvânia, EUA: os Estudantes da Bíblia, como eram então conhecidos.
A vida de uma TJ é muito restrita. A liderança da
religião proíbe seus membros de participar em atividades recreativas fora do
ciclo religioso, como comemorar dias festivos, como exemplo o Natal, o Dia das
Mães, o Dia dos Pais, o Dia dos Namorados e todos os feriados nacionais, além
de não poder comemorar seu próprio aniversário, tampouco de outros.
Esse comportamento resulta no distanciamento gradativo de
seus colegas de trabalho, que, com o tempo, deixam de convidar um funcionário
TJ para pequenos eventos que podem se tornar verdadeiros networks.
O respeito dentro do âmbito de trabalho é fundamental,
mas ninguém é obrigado a não parabenizar um colega dentro de um setor porque
ali tem um TJ. Às vezes torna-se constrangedor todos programarem um
amigo-secreto de final de ano e não ter que incluir uma única pessoa ou duas
por causa de suas crenças. Realçamos aqui que as TJ não são pessoas más, e sim,
são cidadãos honestos e no fundo pessoas de boa índole, se vestem bem e evitam
em se envolver em brigas, mas quando se trata de relacionamentos que vão além
do ambiente de trabalho, podem se tornar isolados; e em época de corte, se não
forem muito competentes, serão os primeiros a serem demitidos do quadro de
funcionários.
Devemos buscar o bom
senso, como Washington Gonçalves fez. Há uma versão boa e justificável para
tudo que fizemos de bom e que nos agrada, como nas datas comemorativas. Nem
tudo está atrelado à religião ou seitas, e sim, à cultura, que deve ser
respeitada e compreendida. E o bom senso está em distinguir filosofia religiosa
e cultura.
Não podemos mais generalizar esses exemplos citados. Com
tantas mudanças que o meio religioso vem sofrendo, podemos encontrar pessoas
quebrando paradigmas e afrontando alguns ditames religiosos, para fazer parte
de uma egrégora espiritual em um ambiente de trabalho, porque ninguém quer se
sentir excluído do meio social fora das igrejas, mesmo que dentro delas
considerem uma desobediência ou até mesmo uma seita contra os padrões litúrgicos
em que convivem.
VALORES
ÉTICOS E PRINCÍPIOS DE CONDUTA
Conforme Leonardo Boff (2006, p.51), a espiritualidade é
uma dimensão de cada ser humano, que se revela pela capacidade de diálogo
consigo mesmo, embora esteja encoberta atualmente pelas cinzas do consumismo,
do materialismo, da competitividade e da ganância. Por isso cabe a cada
indivíduo desenvolver a responsabilidade de aplicar seus princípios espirituais
no dia-a-dia.
Devemos sempre nos lembrar que passamos a maior parte de
nossas vidas no ambiente de trabalho, portanto torna-se coerente que nosso
trabalho constitua um terreno fértil para semearmos a nossa espiritualidade, um
grande laboratório para testarmos nossos valores éticos e princípios de
conduta.
Enquanto cidadãos civilizados, nós devemos estar sempre
lembrando que a vivência e os empirismos cotidianos formam e fortalecem o
caráter, mesmo sendo imprescindíveis a leitura e o estudo.
“A
espiritualidade tem uma ligação umbilical com o trabalho. É por meio dele que
externamos a educação ética, os valores morais e os princípios de cidadania que
aprendemos ao longo da existência. Ao falharmos na assimilação dessas
dimensões, estamos falhando na projeção e exteriorização da nossa própria
espiritualidade”.
(VASCONCELOS,
2008)
As organizações são um reflexo do capital humano que
nelas habita. Logo, quanto mais conectados com a espiritualidade estiverem os
funcionários, mais ética e comprometida será. A espiritualidade pode e deve ser
fomentada pelas políticas internas das organizações. Ela só permeará as
condutas práticas de uma organização se for induzida e praticada pelos gestores
da empresa.
A busca coletiva em defesa da qualidade de vida nas
empresas não cria respaldo nas exigências diárias de que devemos trabalhar cada
vez mais e melhor, no lugar de três ou mais funcionários, mas muitas empresas
agem cinicamente neste ponto. As crises comprovam isso! A primeira atitude
adotada pela maioria das empresas na crise da bolha imobiliária (em 2008/2009)
foi aplicar a saída mais fácil: a demissão de funcionários, que acontecem
ironicamente quando as empresas mais enfatizam a necessidade de comprometimento
por parte dos seus empregados, gerando um efeito residual extremamente negativo
nas corporações. Ou seja, entre os que ficaram, desenvolvem a angústia,
insegurança e o medo de serem os próximos da lista, e conseqüentemente, geram
desmotivação, estresses, falta de atenção, competitividade, deslealdade, entre
outros comportamentos tóxicos que acabam contaminando todo o ambiente de
trabalho.
Mesmo que algumas demissões sejam explicáveis e
necessárias para o balanço financeiro da empresa, a forma como são administradas
pelos gestores revela muito sobre o caráter, ou sobre a falta dele, dentro das
organizações. Quando atreladas aos princípios da espiritualidade, a aceitação é
maior e os sentimentos negativos se manifestam numa proporção significantemente
menor.
Manz (2006) assegura que os valores de negócio que
enfocam exclusivamente em resultados financeiros podem estar em total
incoerência com as profundas crenças pessoais e até mesmo espirituais de um
indivíduo. Sendo assim, quando um indivíduo possui valores como integridade e
honestidade, mas o trabalho nas empresas destaca uma busca impiedosa de
lucratividade, ele pode sofrer grande pressão para agir com frieza e até mesmo
sem ética.
Ter livre-arbítrio para expressar seus valores
dentro da empresa, sentir-se livre para pensar e agir sobre o trabalho, sentir
orgulho e identificar-se com a equipe são elementos fundamentais sinalizados para
uma relação mais próxima entre comunidade, organização e indivíduo (Mitroff
& Denton, 1999; Bell & Taylor, 2004). Essa relação daria maiores níveis de
satisfação e até mesmo de produtividade, como nota Mitroff e Denton (1999) em
estudos com gerentes de várias organizações que utilizam os conceitos de
espiritualidade no trabalho.
CONCLUSÃO
Em sua origem, todo trabalho era considerado sagrado, não
havendo dimensões seculares e espirituais da vida. A Revolução Industrial foi a
autora da separação entre o ambiente de trabalho e o contexto mais geral de
vida e valores dos indivíduos. Contudo, atualmente as empresas começam a
resgatar os valores espirituais, aumentando a consciência de que a cooperação,
qualidade, produtividade e criatividade não sejam alcançáveis por funcionários
que trabalham apenas para ganhar benefícios materiais, mas sim, para
desenvolver seus valores e significados positivos de seu trabalho para si
próprios e para o mundo.
Chega-se à compreensão que a espiritualidade e o
auto-conhecimento estão interligados diretamente, excitando atuações de
transformações pessoais e, conseqüentemente, de seus ambientes. No alcance em
que a empresa desenvolve com maior lucidez sua missão e visão, num método que
gerencialmente é designado de planejamento estratégico, revelam-se as intenções
reais, que precisam ter uma dimensão de transcendência, de servir a uma causa
maior.
Quando os indivíduos se conectam a dimensão espiritual de
suas tarefas do cotidiano, novos significados surgem. A espiritualidade pode
enriquecer nossas experiências dentro das organizações e servir como
laboratório para nosso crescimento individual e coletivo.
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